quarta-feira, 4 de abril de 2012
HIPERIDROSE
Conceito, Incidência, Quadro Clínico
O suor é necessário para o controle da temperatura corpórea, especialmente durante o exercício ou sob temperaturas mais elevadas do ambiente. A sudorese é regulada pelo sistema nervoso autônomo simpático. A hiperatividade das glândulas sudoríparas levam à perspiração excessiva. Esta condição é conhecida como hiperidrose.
A hiperidrose é situação relativamente freqüente, com incidência relatada entre 0,6 a 1 % da população. Não se tratando de doença grave, quanto a risco de vida, trata-se de situação extremamente desconfortável, que causa profundo embaraço social e transtornos de relacionamento e psicológicos no portador, que freqüentemente se isola socialmente e adquire hábitos procurando esconder o seu problema. Curiosamente, por diversos fatores, uma parcela ínfima dos pacientes tem seu problema resolvido e tratado de forma eficaz e duradoura.
A hiperidrose pode ser primária ou secundária a uma doença de base como hipertiroidismo, distúrbios psiquiátricos, menopausa ou obesidade. No presente trabalho focalizamos a abordagem terapêutica da hiperidrose primária.
O início dos sintomas pode ocorrer na infância, na adolescência ou somente na idade adulta, por razões desconhecidas. Eventualmente podemos encontrar história familiar.
Os pacientes referem sudorese constante, as vezes inesperada, mas a maioria deles relata fatores agravantes. Os fatores desencadeantes da sudorese excessiva são o aumento da temperatura ambiente, o exercício, a febre, a ansiedade e a ingestão de comidas condimentadas. Geralmente há melhora dos sintomas durante o sono. O suor pode ser quente ou frio, mas a sudorese é constante. Pode afetar todo o corpo ou ser confinada à região palmar, plantar, axilar, inframamaria, inguinal ou cranio-facial.
A sudorese excessiva e constante é uma condição constrangedora, desagradável, que dificulta as atividades do dia-a-dia e interfere no trabalho, no lazer e nas atividades sociais. Atividades diárias como escrever, apertar a mão de outra pessoa, segurar papéis, e outras atitudes simples podem ser adversamente afetada pela hiperidrose. Quando o quadro de hiperidrose é grave, ocorre gotejamento espontâneo na região afetada. Nos casos mais graves, a pele pode ficar macerada ou mesmo fissurada. Quando a sudorese é mais intensa na região axilar, outros sintomas desagradáveis são relatados. O exsudato pode causar odor fétido (bromidrose). O odor fétido é causado pela decomposição do suor e debris celulares de bactérias e fungos. Assim, pode contribuir para o aparecimento e manutenção de outras doenças de pele como infecções piogênicas, fúngicas, dermatite de contato, etc.
CONSEQUÊNCIAS NA VIDA PESSOAL
O excesso de sudorese constitui-se em uma situação constrangedora e desagradável, que dificulta as atividades do dia-a-dia, podendo interferir no trabalho, no lazer e nas atividades sociais. Ações como segurar papéis, apertar a mão de outra pessoa, escrever podem tornar-se extremamente aterrorizantes.
Existem casos de crianças que não conseguiam ser alfabetizadas, devido ao grande estresse que o fato de ir à escola representava a essas crianças. Adolescentes acometidos podem manter-se isolados das outras pessoas, não conseguindo estabelecer relacionamentos. A doença pode até atrapalhar na hora da escolha da profissão, já que não adianta ter talento para o desenho se o suor excessivo nas mãos impede a pessoa de exercer essa atividade.
Quando a sudorese é muito intensa, a decomposição do suor e das células mortas leva à produção de odor desagradável. Essa situação é mais comum nos indivíduos com hiperidrose acometendo as axilas. Leva, portanto, a intenso desconforto para o indivíduo, que procura se isolar das outras pessoas. Essa alteração do cheiro do suor é chamada de "bromidrose".
TRATAMENTOS
Existem basicamente dois tipos de tratamento, o clínico e o cirúrgico. É importante ressaltar que a escolha depende da intensidade do caso, e também da opção do paciente e do médico.
O tratamento clínico leva a resultados precários porque não é definitivo, e alguns métodos podem ser desagradáveis, caros e devem ser repetidos regularmente. O tratamento não-cirúrgico pode ser realizado da seguinte forma:
Substâncias antiperspirantes e adstringentes: objetivam reduzir a produção do suor. Devem ser aplicadas após o banho, antes de deitar-se. Elas podem causar irritação na pele ou deixá-la amarelada.
Talco ou amido de milho: indicado nos casos de doença mais leve. Devem ser aplicados entre os dedos, sob as mamas e nas demais pregas da pele.
Banho com sabonete desodorante: seu uso prolongado pode irritar a pele.
Não utilizar o mesmo par de sapatos vários dias seguidos, e usar palmilhas absorventes.
Medicamentos tomados por via oral, como antidepressivos e outros para ansiedade. No entanto, o alívio dos sintomas é parcial.
Psicoterapia, técnicas de biofeedback.
Iontoforese: método de tratamento que se caracteriza pela aplicação de corrente elétrica na superfície da pele, com o objetivo de facilitar a penetração de medicamentos na mesma.
Uso de toxina botulínica
Comumente são realizadas de 35 a 40 aplicações em cada região, a cada sessão. A duração do efeito é de 4 a 6 meses, sendo necessária nova sessão após esse período. Geralmente, as pessoas conseguem suportar até 4 sessões. É importante saber que a dose necessária é quase próxima da dose tóxica; sendo assim, como o benefício não é definitivo, nos pacientes com sintomas mais intensos e que interferem muito em suas vidas, pode estar indicado o tratamento cirúrgico.
COMO É A CIRURGIA PARA HIPERIDROSE?
O tratamento cirúrgico consiste na chamada "Simpatectomia Torácica". Existe, ao lado da coluna torácica, uma estrutura denominada cadeia simpática. Ela é constituída por pequenos gânglios que controlam, além de outras coisas, a produção do suor. A cirurgia consiste na eliminação dos gânglios envolvidos na doença. Antigamente, a cirurgia era feita por duas incisões ("cortes") no pescoço, mas atualmente vem sendo realizada por técnicas de videolaparoscopia. Essa técnica mais nova necessita de duas pequenas incisões, levando a cicatrizes praticamente imperceptíveis.
A cirurgia está indicada geralmente nos pacientes com hiperidrose que não é decorrente de outras doenças. Nesses casos, o tratamento da doença principal leva, freqüentemente, à melhora dos sintomas.
Os resultados da cirurgia são dramáticos. Quando acorda da anestesia, o paciente já percebe que não apresenta mais o excesso de suor nas axilas e nas mãos, sendo que a sudorese do pé reduz-se em 70%. Eles relatam que há muitos anos não sentiam suas mãos quentes e secas. Os resultados são permanentes e a melhora da qualidade de vida é indiscutível.
Como essas pessoas não suam mais nas mãos e nas axilas, pode haver aumento da sudorese em outras regiões do corpo, principalmente quando estão em locais quentes, fazendo exercícios físicos ou tomando sol. No entanto, a minoria desses pacientes apresentará queixa de tais sintomas e achará que não valeu a pena ter sido submetido à cirurgia. O que ocorre é que esses sintomas não incomodam o paciente
ESTUDOS RECENTES SOBRE HIPERIDROSES
Hiperidrose primária de mãos e axilas é uma doença crônica capaz de
trazer prejuízos e sofrimento subjetivo importante. A simpatectomia torácica é o método
de tratamento de escolha para tal enfermidade. Registrar a satisfação dos pacientes com a
cirurgia e abordar tal aspecto comparando duas técnicas cirúrgicas distintas foram os objetivos deste estudo.
Métodos: Realizou-se um estudo de casos com amostra de 60 pacientes, os quais
responderam o Questionário de Qualidade de Vida – devidamente autorizado pelo seu
autor, Dr. José Ribas Milanez.
Resultados: A Qualidade de Vida após a cirurgia estava melhor em 98,3% e apenas
1,7% não relataram modificação. Houve sudorese compensatória em 80% dos casos, sendo que em comparação às duas técnicas cirúrgicas, houve mais casos de compensação na
técnica de ressecção de gânglios simpáticos T3+T4. No aspecto da satisfação, a técnica
que incluía também ressecção de T2 apresentou números mais expressivos, sem, no entanto, significado estatístico.
Conclusão: A simpatectomia torácica é um método terapêutico eficiente para hiperidrose primária de mãos e axilas. Não há diferenças estatísticas em mudança na qualidade
de vida nos pacientes operados pelas duas técnicas cirúrgicas propostas. Embora haja
resultados numéricos que apontam uma maior satisfação com a técnica que inclui T2,
estatisticamente não houve diferenças. Uma totalidade de 98,3% relataram melhora em
sua qualidade de vida.
UNITERMOS: Simpatectomia Torácica Vídeo-Assistida, Qualidade de Vida, Hiperidrose Primária de Mãos e Axilas.
SIMPATECTOMIA TORÁCICA VIDEOTORASCÓPICA
Histórico
Há muitos anos sabe-se que a simpatectomia cervico-torácica poderia eliminar os sintomas da hiperidrose palmar. A presença de complicações sérias após a operação convencional ? principalmente a Síndrome de Horner causada pela lesão do gânglio estrelado ( ptose palpebral, enoftalmia, miose) ? fez com que esse procedimento fosse pouco utilizado no tratamento da hiperidrose. A simpatectomia torácica convencional foi pouco utilizado pois envolvia a realização de uma toracotomia tradicional, posterior, aberta, invasiva (cirurgia de porte considerável) com todos os seus riscos, para o tratamento de uma condição benigna. Esta via de acesso apresenta desvantagens como a necessidade de internação hospitalar mais prolongada, com demora no retorna às atividades habituais, dor no período pós operatório e resultado estético pouco satisfatório.
Na década de 90, com o advento da videotoracoscopia e a sistematização de suas indicações possibilitou que esse procedimento fosse indicado e utilizado com significante benefício para os pacientes. Com a videotoracoscopia, através de pequenas incisões, o cirurgião pode retirar ou destruir a porção da cadeia simpática que interessa no tratamento da afecção. É método seguro, pois permite a abordagem precisa, sob visão direta, poupando as estruturas vizinhas, particularmente o gânglio estrelado. O resultado é imediato e duradouro. O paciente recebe alta no dia seguinte à operação e retorna rapidamente a suas atividades habituais.
Indicação Cirúrgica
A simpatectomia torácica pode ser utilizada no tratamento da hiperidrose palmar e axilar, na distrofia simpática reflexa, em casos selecionados de isquemia grave de membro (doença vascular periférica embólica ou aterosclerótica), doença de Raynaud e causalgia. Os melhores resultados são encontrados no tratamento da hiperidrose primária. Os pacientes portadores de hiperidrose primária grave, geralmente já tentaram inúmeros tipos de tratamento conservador, prescritos por vários clínicos, dermatologistas e até psiquiatras.
O procedimento está contra-indicado nos pacientes portadores de hiperidrose secundária, nos pacientes portadores de insuficiência respiratória ou cardiovascular grave (impossibilidade de ventilação monopulmonar durante o procedimento) e nos pacientes com seqüela de doença pleural (tuberculose, empiema).
Técnica Operatória
O paciente pode ser internado na véspera ou no próprio dia da operação.
A simpatectomia toracoscópica é realizada na sala de operação, onde o paciente é inicialmente monitorizado e anestesiado. Utilizamos a anestesia geral e intubação brônquica, com o paciente em decúbito dorsal horizontal. Durante todo o procedimento, o paciente é monitorizado com pressão arterial média não invasiva, cardioscópio, saturômetro de pulso e capnógrafo.
O procedimento operatório pode ser realizado com o paciente em decúbito lateral ou dorsal horizontal com abdução dos membros superiores, de maneira a formar um ângulo de 90º com o tórax (casos de abordagem bilateral).
No procedimento clássico, com ressecção da cadeia simpática de T2 a T4, o equipamento necessário para a operação consiste de uma óptica rígida de 5 a 10 mm de diâmetro, com ângulo de 0º, câmera e o monitor de vídeo para visibilização do campo operatório. Os instrumentos utilizados são: uma tesoura tipo Metzenbaum de 5mm de diâmetro acoplada ao termocautério, uma pinça hemostática (dissector) curva de 5 mm de diâmetro e um aspirador/irrigador. Utilizamos por vezes aplicadores de clip laparoscópico e um afastador retrátil.
Na operação clássica, após o bloqueio pulmonar, três pequenas incisões são realizadas nos espaços intercostais da região axilar. Por uma das incisões é introduzido o endoscópio para visualizar o campo operatório, e pelo outros dois orifícios são introduzidos os instrumentos necessários para realizar a operação. Após a realização da primeira incisão (3º ou 4º espaço intercostal, linha axilar média), a câmera é inserida, para visualizar a abertura e introdução dos outros ports e instrumentos.
O procedimento começa com exploração da cavidade pleural e liberação de eventuais aderências. A cadeia simpática é então visibilizada sob a pleura parietal que reveste da 1º a 4 º costela. Pode-se então identificar os gânglios responsáveis pela área afetada por hiperidrose. Estes gânglios serão removidos, após abertura da pleura parietal e dissecção dos mesmos. Para revisão da hemostasia, utilizamos lavar o leito operatório com soro fisiológico. Um dreno pleural 20 ou 24F é colocado por um dos "ports" e posicionado endoscopicamente. Os instrumentos são retirados, o pulmão é insuflado e as incisões são fechadas com fio absorvível. O procedimento é repetido no outro hemitórax.
Esse procedimento dito "convencional" tem sofrido diversas modificações, sempre tentando tornar o procedimento mais simples e rápido. No nosso grupo, temos utilizado de rotina apenas duas incisões de 5mm, dissectores mais finos e a dremagem pleural tem sido dispensada. A disponibilidade de opticas de 2mm com qualidade de imagem bastante aceitável (Minisite, USSC) fez com que alguns cirurgiões desenvolvessem técnica com único orifío, como uma perfuração de agulha ("needlescopic sympathicotomy"). Claro que com esta técnica, o cirurgião apenas destroi com eletrocoagulação, ou laser, o gânglio T2.
Pós Operatório
Ao término do procedimento, o paciente é encaminhado a sala de recuperação anestésica, onde é realizado radiografia de tórax. Após alta da recuperação anestésica, o paciente é encorajado a deambular no quarto, e a iniciar dieta liquida. Administramos analgésicos por via oral nos primeiros dias do período pós-operatório.
O paciente é orientado para exercícios respiratórios inspiração profunda e sustentada.
Na ausência de complicações, o paciente pode receber alta no dia seguinte à operação.
O paciente pode retornar a suas atividades habituais dentro de poucos dias, no máximo dentro de 7 a 10 dias.
As cicatrizes são muito pequenas, quase imperceptíveis e não há pontos na pele para serem retirados.
Resultados Cirúrgicos
Os resultados são dramáticos. As extremidades superiores (membros superiores e axilas) encontram-se secos e quentes assim que o paciente recupera-se da anestesia em 95% dos casos. Os pacientes referem que pela primeira vez, em muitos anos, as mãos estão secas e quentes. Em 70% das vezes, o mesmo ocorre em relação à hiperidrose plantar e craniofacial. Podemos notar ainda, melhora em relação à palpitações e taquicardia. Os resultados são geralmente permanentes. A melhora na qualidade de vida é indiscutível.
Efeitos Colaterais e Complicações
Em 20 a 50% dos pacientes, pode ocorrer hiperidrose compensatória. Trata-se de um aumento da sudorese em outras partes do corpo, geralmente no dorso e coxas. Provavelmente representa uma resposta termo-reguladora do organismo (GJERRIS & OLESEN, 1975). Esta condição é tolerável para maioria dos pacientes: cerca de 10% apenas queixam-se desta perspiração excessiva, mas a toleram melhor que a sudorese palmar. Na maioria dos casos, o quadro melhora com o passar do tempo (aproximadamente 6 meses) ou o paciente aprende a conviver com ela (ADAR 1994, LEAO et al, 1999). Acredita-se que a ressecção mais econômica da cadeia simpática possa resultar em hiperidrose compensatória menos acentuada (GOSSOT, 1995, KAO et al., 1996).
A nevralgia intercostal esta relacionada ao trauma de costelas e feixe vasculo-nervoso por trocaters, lesão térmica ou uso de dreno pleural pós operatório.
A síndrome de Claude- Bernard-Horner (ptose palpebral, miose, enoftalmia) é complicação rara, relacionada à lesão do gânglio estrelado. Sua ocorrência é extremamente baixa nas mãos de um cirurgião experiente.
O pneumotórax residual pós operatório é uma complicação possível, que na maioria das vezes, resolve-se espontaneamente (é absorvido), não necessitando intervenção específica.
O hemotórax, a lesão do parenquima pulmonar, do plexo braquial e a infecção da ferida operatória também são complicações possíveis, embora bastante raras.
Conclusão
A simpatectomia videotoracoscópica tem se mostrado o único método eficaz para curar a hiperidrose moderada e grave de mãos e faces. É o método de escolha, especialmente se outras opções terapêuticas já foram testadas, sem resultado satisfatório. Constitui-se também em método eficaz para o tratamento do "blushing facial".
A técnica endoscópica é extremamente segura e eficaz, pois conduz à cura definitiva em quase 100% dos casos.
FONTES DE PESQUISA:VATS da UNIFESP; BIBLOMED; REVISTA DA AMRIGS.
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